sábado, julho 12, 2008

PERDIDO NO TEMPO

David Mourão Ferreira



"PARAÍSO"




Deixa ficar comigo a madrugada,


para que a luz do Sol me não constranja.


Numa taça de sombra estilhaçada,


deita sumo de lua e de laranja.




Arranja uma pianola, um disco, um posto,


onde eu ouça o estertor de uma gaivota...


Crepite, em derredor, o mar de Agosto...


E o outro cheiro, o teu, à minha volta!




Depois, podes partir. Só te aconselho


que acendas, para tudo ser perfeito,


à cabeceira a luz do teu joelho,


entre os lençóis o lume do teu peito...




Podes partir. De nada mais preciso


para a minha ilusão do Paraíso.






O meu comentário???


Uma ilusão...





Um desejo....





Presos entre as recordações....





Entre os lençóis amarrotados....





Alguém que parte e leva parte de nós...





As dúvidas eternas....





Respostas que se encontram...





Com o tempo...





Que julgamos ter perdido, mas está sempre ali........

quinta-feira, julho 10, 2008

MUNDO A NOSSOS PÉS

EXERCÍCIO ESPIRITUAL

Mário Cesariny de Vasconcelos

É preciso dizer rosa em vez de dizer idéia
é preciso dizer azul em vez de dizer pantera
é preciso dizer febre em vez de dizer inocência
é preciso dizer o mundo em vez de dizer um homem

É preciso dizer candelabro em vez de dizer arcano
é preciso dizer Para Sempre em vez de dizer Agora
é preciso dizer O Dia em vez de dizer Um Ano
é preciso dizer Maria em vez de dizer aurora

O meu comentário???

E essa aurora ter todos os nomes....
E o Agora ser este momento que não se repete....
Pois há momentos que são únicos...
E quanto ao azul....
Nunca se sabe onde começa e onde acaba....
Dura muito mais do que Um Ano...
É o Mundo a nossos pés....

quarta-feira, julho 09, 2008

ENCONTRO

poema




Em todas as ruas te encontro


em todas as ruas te perco


conheço tão bem o teu corpo


sonhei tanto a tua figura


que é de olhos fechados que eu ando


a limitar a tua altura


e bebo a água e sorvo o ar


que te atravessou a cintura


tanto tão perto tão real


que o meu corpo se transfigura


e toca o seu próprio elemento


num corpo que já não é seu


num rio que desapareceu


onde um braço teu me procura




Em todas as ruas te encontro


em todas as ruas te perco



Mário Cesariny




O meu comentário???





E de olhos fechados....


Tudo se vê, tudo se sente....


Nada se finge....


Quem mente ao coração....


Perde-se no labirinto dessas ruas...


Num turbilhão de contradições.........


Entre histórias mal contadas...


O Amor não pode ser uma história mal contada....


Tem que ser vivida, sentida, partilhada....


Ou então, andamos sempre perdidos........


terça-feira, julho 08, 2008

CORES DE OUTONO

Antes de amar-te, amor, nada era meu

Vacilei pelas ruas e as coisas:

Nada contava nem tinha nome:

O mundo era do ar que esperava.

E conheci salões cinzentos,

Túneis habitados pela lua,

Hangares cruéis que se despediam,

Perguntas que insistiam na areia.

Tudo estava vazio, morto e mudo,

Caído, abandonado e decaído,

Tudo era inalienavelmente alheio,

Tudo era dos outros e de ninguém,

Até que tua beleza e tua pobreza

De dádivas encheram o outono.


Pablo Neruda



O meu comentário???



E encontraste o motivo para viver....



Por medo não falavas...



Através do amor, soltaste essas palavras...



Abandonadas, amordaçadas....



Espezinhadas....



E, no cinzento da alma, pintaste as cores ricas...



Desse amor que te libertou e te fez olhar em frente...............

segunda-feira, julho 07, 2008

ULTRAPASSA

Amor, quantos caminhos até chegar a um beijo,


que solidão errante até tua companhia!


Seguem os trens sozinhos rodando com a chuva.


Em tal não amanhece ainda a primavera.


Mas tu e eu, amor meu, estamos juntos,


juntos desde a roupa às raízes,


juntos de outono, de água,


de quadris, até ser só tu, só eu juntos.


Pensar que custou tantas pedras que leva o rio,


a desembocadura da água de Boroa,


pensar que separados por trens e nações


tu e eu tínhamos que simplesmente amar-nos


com todos confundidos, com homens e mulheres,


com a terra que implanta e educa cravos.


Pablo Neruda


O meu comentário???

O que ultrapassa...

As convenções...

.........os limites, a linha do horizonte....

Mesmo as estações.....

De que os cépticos desconfiam....

Mas os verdadeiros amantes vivem...

Com os altos e os baixos....

Com os risos e as lágrimas....

Simplesmente....

Amar é isso....

Sentir-se completo....

Verdadeiramente........

ALMA SEM PAZ

Esperemos






Há outros dias que não têm chegado ainda,



que estão fazendo-se



como o pão ou as cadeiras ou o produto



das farmácias ou das oficinas



- há fábricas de dias que virão -



existem artesãos da alma



que levantam e pesam e preparam



certos dias amargos ou preciosos



que de repente chegam à porta



para premiar-nos



com uma laranja



ou assassinar-nos de imediato.






Pablo Neruda (Últimos Poemas)



O meu comentário???



Melhor viver o dia presente....



Seguir a brisa...



Seguir o coração...



Amanhã, o mundo pode estar diferente...



Mais egoísta, mais corrupto...



Mais violento.....



Enterrar-nos num mutismo vigiado...



Cada palavra ofensiva....



A alma sem paz.....

domingo, julho 06, 2008

QUEM SABE?

Quero saber




Quero saber se você vem comigo




a não andar e não falar,


quero saber se ao fim alcançaremos




a incomunicação; por fim




ir com alguém a ver o ar puro,




a luz listrada do mar de cada dia




ou um objeto terrestre




e não ter nada que trocar




por fim, não introduzir mercadorias




como o faziam os colonizadores




trocando baralhinhos por silêncio.




Pago eu aqui por teu silêncio.




De acordo, eu te dou o meu






Com uma condição: não nos compreender








Pablo Neruda (Últimos Poemas)



O meu comentário???



Uma outra forma de solidão....



Está tudo dito no silêncio....



Viver as coisas como elas são...



Sem as embelezar....



Expressar o que se sente, o que nos dizem...



Apenas a companhia....



Sem troca de impressões, ideias, projectos...



Cansaço, desilusão...com a vida em si???



Quem sabe?