quarta-feira, dezembro 29, 2010

VIAGEM SEM FIM

É o vento que me leva.
O vento lusitano.
É este sopro humano
Universal
Que enfuna a inquietação de Portugal.
É esta fúria de loucura mansa
Que tudo alcança
Sem avançar.
Que vai de céu em céu.
De mar em mar.
Sem nunca chegar.
E esta tentação de me encontrar
Mais rico de amargura
Nas pausas de ventura
De me procurar...

"Viagem" de Miguel Torga, Diário XII

O meu comentário???
Uma viagem sem fim...
Nunca nos conhecemos totalmente.....
Nunca dizemos tudo....
Entregamos a vida ao Vento.....
Vagueamos com ele,
libertamo-nos dessa amargura que fica...
Quando tudo desaparece
e ficamos sós....
Chora-se, grita-se, lamenta-se...
E continuamos à procura....
De quê???
Um sentido,
uma palavra de alento,
uma esperança..........
No tempo, na vida....

sábado, dezembro 25, 2010

MOMENTOS MEMORÁVEIS

Foi bonito
O meu sonho de amor
Floriram em redor
Todos os campos em pousio.
Um sol de Abril brilhou em pleno estio,
Lavado e promissor.
Só que não houve frutos
Dessa Primavera.
A vida disse que era
Tarde demais.
E que as paixões tardias
São ironias
Dos deuses desleais

"Frustração" de Miguel Torga, Diário XV

O meu comentário???
Não há paixões tardias....
Há apenas paixões...
E momentos para viverem em nós....
Às vezes, espera-se demais
e elas fogem....
Outras, encostam-se devagar....
E descobrimos um labirinto de emoções desconhecidas...
Que percorrem os corredores da vida,
afastando essas ironias
e essas deslealdades...
Por momentos memoráveis......



quarta-feira, dezembro 22, 2010

PRINCIPE ESFARRAPADO

Percorro o dia, que esmorece
Nas ruas cheias de rumor;
Minha alma vã desaparece
Na minha pressa e pouco amor.

Hoje é Natal. Comprei um anjo,
Dos que anunciam no jornal;
Mas houve um etéreo desarranjo
E o efeito em casa saiu mal.

Valeu-me um princípe esfarrapado
A quem dão coroas no meio disto,
Um moço doente, desanimado...
Só esse pobre me pareceu Cristo.

"Natal Chique" de Vitorino Nemésio

O meu comentário???
Não tenho pressa...
O tempo que tenho dedico-o
ao meu princípe esfarrapado...
Perdido em memórias
que não são bem memórias...
O tempo não é nada;
o mundo...o que é o mundo?
Não sei responder,
porque não há palavras....
Há, sim, amor e dedicação....
Todos os dias do ano,
sem excepção....
O meu princípe esfarrapado é o meu Pai....
88 anos,
doente de Alzheimer.....

O "Com Amor" deseja-vos um Feliz Natal e um Bom Ano 2011....



domingo, dezembro 19, 2010

A ÚNICA COISA

Quem me dera que eu fosse o pó da estrada
E que os pés dos pobres me estivessem pisando...
Quem me dera que eu fosse os rios que correm
E que as lavadeiras estivessem à minha espera...
Quem me dera que eu fosse os choupos à margem do rio
E só tivesse o céu por cima e a água por baixo...
Quem me dera que eu fosse o burro do moleiro
E que me batesse e me estimasse...
Antes isso que ser o que atravessa a vida
Olhando para trás de si e tendo pena..

"Quem me dera que eu fosse o pó da estrada" de Alberto Caeiro

O meu comentário????
O sabor amargo da derrota...
O desalento e a tristeza tão latentes...
Nas lágrimas que sinto
em cada uma das palavras...
Porque também olhei para trás
e tive pena....
Não é para trás que devemos olhar;
é caminhar em frente...
Disfarçar a dor num sorriso,
que hoje não está no olhar,
mas amanhã quem sabe???
São pequenos passos,
pequenas vitórias,
 mas acontecem....
E valem a pena,
porque nos ensinam
que a única coisa de que devemos ter pena
é termos perdido tempo....
A ter pena de nós próprios....




terça-feira, dezembro 14, 2010

CHEIROS, EMOÇÕES E SENTIMENTOS

Ás vezes, em dias de luz perfeita e exacta,
Em que as coisas têm toda a realidade que podem ter,
Pergunto a mim próprio devagar
Porque sequer atribuo eu
Beleza às coisas.

Uma flor acaso tem beleza?
Tem beleza acaso um fruto?
Não: têm cor e forma
E existência apenas.

A beleza é o nome de qualquer coisa que não existe.
Que eu dou às coisas em troca do agrado que me dão.
Não significa nada.
Então, porque digo eu das coisas: são belas?
Sim, mesmo a mim, que vivo só de viver,
Invisíveis,  vêm ter comigo as mentiras dos homens.
Perante as coisas.
Perante as coisas que simplesmente existem.
Que difícil ser próprio e não ser senão o vísivel!

"Às vezes, em dias de luz perfeita e exacta" de Alberto Caeiro

O meu comentário???
Claro que significa...
Sem a beleza, as mentiras dos homens
seriam ainda mais duras...
A luz deixaria de ser perfeita
e o simples não existiria....
Não é o visível que se procura;
é o que está por detrás desse visível....
Muito mais que a forma e a cor....
É o assimilar dessa forma e dessa cor....
Em cheiros, emoções, sentimentos....

quinta-feira, dezembro 09, 2010

RIMAS VERDADEIRAS

Não me importo com as rimas. Raras vezes
Há duas árvores iguais, uma ao lado da outra.
Penso e escrevo como as flores têm cor.
Mas com menos perfeição
no meu modo de exprimir-me.
Porque me falta a simplicidade divina
De ser todo só o meu exterior.
Olho e comovo-me.
Comovo-me como a água corre quando o chão é inclinado.
E a minha poesia é natural como levantar-se o vento.

"Não me importo com as rimas" de Alberto Caeiro

O meu comentário???
É simples e é divino....
Exactamente por isso...
Por ser natural e falar com alma...
Da cor das flores,
das lágrimas que insistem em espreitar...
Do vento que nos acaricia
e nos enlouquece...
Da fantasia que rompe a escuridão...
Do simples acto de respirar
e estar presente....
Em rimas verdadeiras....

segunda-feira, dezembro 06, 2010

TOLERANTES

Não sou a areia
onde se desenha um par de asas
ou grades diante de uma janela.
Não sou a pedra que rola nas marés
do mundo, em cada praia renascendo outra.
Sou a orelha encostada na concha da vida,
sou construção e desmoronamento, servo e senhor
e sou mistério.
A quatro mãos escrevemos este roteiro
para o palco da minha vida; o meu destino e eu.
Nem sempre estamos afinados, nem sempre nos levamos a sério.

"Convite" de Lya Luft (Santa Cruz do Sul, RS, n.1938)

O meu comentário???
O verdadeiro mistério...
é saber como continuamos vivos...
Se dominamos o mundo
ou se ele nos domina.
Se vamos encontrar resposta
para todas as questões
ou só para algumas.
O que é o destino?
Que papel desempenhamos nele?
Talvez seja a loucura
ou a tolerância.
Ou a resposta esteja no
respeito.
Por aquilo que somos...
Mesmo que sejamos
a tal pedra, escondida
na areia e que
se atira novamente
para o mar....

sexta-feira, novembro 19, 2010

TÃO MAL

Il recuille toute la beauté
Qui l'entoure aux creux de ses mains
Il prend le chemin de la liberté
Et il fait un voyage lá au loin.

Partir en vérité ou en rêve?
Il doit choisir une seule solution
La vie est tellement brève
Qu' il ne se fasse pas d'illusion!

Qu'il soit prudent ou intrépide
Il doit prendre cette décision,
Qu'il danse ou vole comme une sylphide
Il décide de sa propre évasion.

Qu'il ne regarde pas en arriére
Et emmène tous ses souveniers
Ceux de sa vie toute entière
S'il ne pouvait au départ revenir.

Rencontrera-t-il l'amour?
Sera-t-il sur son passage?
Qui sait si un beau jour
Il trouvera de lui un message.

Comme un Songe dans une nuit d'Été,
A force de chercher dans les contes,
Il oublie que ce sentiment, l'amitié
Est très souvent laissé pour compte.

Reveille-toi, mon cher ami
Ouvre tout grands les yeux.
Car c'est moi qui te le dis
Aveuglé jamais tu le perçois.
Ton regard tourné vers les cieux
Que le bonheur est devant toi

"Liberté ou prison des rêves" par Verdinha (Blog "Je vois la Vie en Vert")

O meu comentário???
A verdade é que não queremos acordar...
Acreditar que a realidade é tudo,
menos aquele sonho fantástico...
Procura-se no sonho a paz
 que não se encontra no mundo...
Sem que se saiba qual é o destino....
Sem termos forças
para decidir o nosso papel...
Não mudamos nada na nossa vida
e as memórias são sonhos inúteis...
Porque nem sequer
sonhamos felizes....
Escapa-se apenas....
e continuamos prisioneiros....
Como é que a vida
nos pode tratar tão mal?






domingo, novembro 14, 2010

BAIXINHO

Eu não voltarei...
E a noite morna, serena, calada,
...adormecerá tudo sob
sua lua solitária.
Meu corpo estará ausente,
e pela janela alta
entrará a brisa fresca
a perguntar pela minha alma.
Ignoro se alguém me aguarda
de ausência tão prolongada,
ou beija minha lembrança,
entre carícias e lágrimas.
Mas haverá estrelas, flores
e suspiros e lembranças
e amor nas alamedas.
E tocará esse piano
como nesta noite plácida
não havendo quem o escute,
a pensar, nesta varanda

Poema de Juan Ramón Jimenez

O meu comentário???
Alguém escuta...
Poderá estar escondido
na sombra da noite..
Deitado na relva,
encostado a uma árvore,
na soleira da porta...
Poderá compreender a mensagem,
identificar a dor...
Saberá também quando
 e se deve interferir...
Ás vezes, temos que ficar calados...
Sentir como a dor fluí,
reconhecer no olhar
que o momento de falar chegou..
E deixar que se fale...
Percorrendo as alamedas,
sentado na areia,
ou com música clássica
 baixinho na sala....


sexta-feira, novembro 05, 2010

OUVE-O

Tenho ciúmes do Vento
Porque acaricia o teu rosto..
E eu não!

Tenho ciúmes do Vento
Porque ele brinca com os teus cabelos...
E eu não!

Tenho ciúmes do Vento
Porque ele murmura ao teu ouvido...
E eu não!

Tenho ciúmes do Vento
Porque ele sopra nos teus lábios...
E eu não!

Tenho ciúmes do Vento
Porque ele beija as tuas mãos...
E eu não!

Tenho ciúmes do Vento
Porque ele abraça-te com força...
E eu não!

Tenho ciúmes do Vento
Porque ele sente o aroma
Do teu perfume...
E eu não!

Tenho ciúmes do Vento
Porque lhe contas os teus sonhos...
E a mim não!....

Poema enviado pelo "O Sofá Amarelo"
do blog com o mesmo nome


O meu comentário???
Se falo com o Vento,
é porque tu não me escutas.
E só lhe falo de ti...
De como me deixas sozinha
e me contas tão pouco
sobre ti...
Como me olhas,
como me desejas
mas não partilhas nada
comigo...
Talvez não te ter conhecido...
não me fizesse sofrer tanto..
Não tenhas ciúmes do Vento...
Ouve-o apenas...




quinta-feira, novembro 04, 2010

NA BELEZA DOS SONHOS

A beleza do fogo no teu peito
Emite tanta luz!...Mas o ardor
Não pode ser mais belo, meu amor
Que o fogo deste amor puro, perfeito!

Venham dos céus tormentas, venha dor,
E o sorriso teu, esse teu jeito,
Num átimo, terão tudo desfeito
E brilharás, de novo, em teu fulgor!

Nem mesmo a luz do Sol, vivo e ardente,
Duvidará, jamais, de que és a rainha
Deste sonho em que vivo dependente...

Acordo com a dor, minha madrinha
Nesta vida real e, lentamente
Adormeço...e, no sonho, sim!...És minha!!!

"Amor Utópico" de Carlos Fragata


O meu comentário???
Há sonhos em que somos reis....
Outros, vagabundos....
Banquetes fartos nuns,
fome e sede noutros..
O que significa um?
O que diz o outro?
Que tudo muda;
ficamos à mercê da sorte.
E, não será a sorte,
essa utopia de que falas?
Porque nos sonhos,
em que descansamos,
somos os reis
e os vagabundos.
Aqui,
nem sempre sabemos
o que somos...



domingo, outubro 31, 2010

CALAR

Céu azul
Azul claro
Azul quase branco
E o contraste
Das nuvens
Cor-de-rosa
E cinza...
Ao longe o brilho
E a sensação de fogo
E as nuvens
Correm e mudam
Constantemente
A sua forma...
E eu ao olhar...
Fico extasiada
Com o que os meus olhos
Vêem
E olho vejo e calo...
E continuo a imaginar!...

"Fogo" poema enviado por Lili Laranjo (Blog "África em Poesia")

O meu comentário???
E o que imagino eu??
Nesse labirinto de cores....
Onde se desenha
a paixão dos meus dias...
O fogo e o gelo....
Sei que é uma dança mortal...
Mas o que não é mortal?
 Se até as próprias nuvens
têm um fim escrito....
Quando o fogo conquista o espaço,
e o gelo se revolta...
 

quinta-feira, outubro 28, 2010

VOZ SUAVE

Meia noite meu anjo vem me buscar
Espero impaciente a hora chegar
Para com ele estar.
Meia noite e não estremeço
Conheço meu anjo
Por ele tenho grande apreço.
Meia noite e o silêncio impera.
Só vento a janela
Assovia sem cessar.
Meia noite e ele chega.
E o quarto todo clareia.
Com luz de beleza singular.
Meia noite e partimos.
Para céus infinitos.
Conhecer ou relembrar paisagens,
Meu anjo e eu.
Voltando sobre a terra.
Tão pequenina cá de cima
Meu anjo e eu.
Nas crateras da lua
Na parte que o Sol a alumia.
Meu anjo e eu.
Nos anéis de Saturno.
Escorregando em gelo e fogo.
Meu anjo e eu.
Em universos para mim desconhecidos.
Velando pelos cometas.
Meu anjo e eu.
Astronautas do sonho.
Assentados nos asteróides inabitados.
Em planetas solitários ao pôr-do-sol.
Meu anjo e eu.
Assistindo a dança do Universo.
O mais pura beleza em um quadro pintado por Deus.
Somento meu anjo e eu

Poema enviado por Giza

O meu comentário???
Vistos lá de cima...
Pontos escuros, sem forma, sem cor.
Uma escuridão pesada,
uma solidão atroz...
Na Terra,
é o céu o mistério...
Não há nada de misterioso no céu
se nos permite escolher...
A beleza desconhecida,
a simplicidade tranquila do sonho....
Porque se vê o amor claramente....
Dançando, confiantes...
Por entre anjos e arcanjos
na voz suave de Deus...

terça-feira, outubro 26, 2010

SOL E VIDA

Sonhei que sou ONDA
Uma onda de LUZ
E o Mundo nesta natureza
Muito me seduz!

Sonhei que sou o SOL
Um sol de mil cores
Um puro arco-íris
Colorida como as flores!

E em dourados reflexos
Em ondas de LUZ
Eu sinto o SAL
Branco como a PAZ
Que muito me satisfaz!

Sonhei que sou o SOL
Desta água dourada
E assim estou perto
Deste círculo de LUZ
Desta roda de PAZ!
Sou uma aprendiz
Deste círculo tão belo
Deste Mundo Feliz

"Em Ondas de LUZ" poema enviado por Helena Nabais

O meu comentário???
Deixar que seja o Sol a conduzir a minha vida hoje..
Que me arranque da sombra e da solidão..
De que tudo que rime com tristeza....
Porque há ondas que falam...
Cores que acariciam o corpo...
Luzes que enfeitiçam o olhar...
E FÉ....
Em olhar em frente
e sabermos que
a alma se volta a erguer,
dessa escuridão,
dessa prisão
e se pinta de dourado...
Porque está sempre apaixonada
pelo SOL
e pela VIDA....


domingo, outubro 24, 2010

QUE DIZER???

O alecrim incendiou-se de aromas
nas vertentes da serra
e contagiou a giesta, o mirto e o rosmaninho.
Aderiu à pele dos que traziam no corpo
a violência do fogo.
Se mais desordem houvera,
mais desenfreado se tornaria
o cavalo alado galopando prazeres.
Como dizer o rio que não coube
no extâse de ser apenas água,
mas uma torrente imensa
a rebentar nos poros dos amantes?

Enviado por Graça Pires (Blog "Ortografia do Olhar)

O meu comentário???
O que dizer na verdade??
Quando nos sentimos invadidos,
conquistados,
esmagados
pelo prazer??
Intensificando os aromas,
libertando-se da pele
e recriando-se no ar...
Nesse gemido sonolento
de quem se amou febrilmente.
E se deixa agora embalar pelo rio
que desafia
a sua própria fúria.
Acalma-se....

Nota: o 1º poema que recebi em resposta ao
desafio do post anterior.
Obrigada, Graça

quinta-feira, outubro 21, 2010

BELEZA E FOGO

Não se pode cortar o fogo com uma faca
 (provérbio grego)

até que Deus é destruído pelo extremo exercício da beleza

Fonte:
"A faca não corta o fogo"
Herberto Helder (Pg 133)

Enviado por JPD do blog "O Gato e o Guizo"

O meu comentário???
Não sei se falas de ciúme ou de ódio..
Ambos ardem numa loucura fria...
Um fogo intenso que corrompe
a beleza dos sentimentos...
Em que se pergunta por Deus
e a culpa é só nossa...
Porque ficamos à superfície das coisas..
Ouvimos e não ouvimos...
Sem entendermos verdadeiramente...
O que deixamos escapar....

DESAFIO:
Com as palavras "beleza" e/ou "fogo"
gostava que me enviassem poemas,
vossos e/ou dos vossos poetas favoritas para eu comentar....



terça-feira, outubro 19, 2010

FRÁGIL E DOCE

pernoitas em mim
e se por acaso te toca a memória...amas
ou finges morrer

pressinto o aroma luminoso dos fogos
escuto o rumor da terra molhada
a fala queimada das estrelas

é noite ainda
o corpo ausente instala-se vagarosamente
envelheço com a nómada solidão das aves

já não possuo a brancura oculta das palavras
e nenhum lume irrompe para beberes

"Pernoitas em mim" de Al Berto in "Rumor dos Fogos"

O meu comentário???
Mas continuas a sentir e a apontar-me as estrelas...
Tudo fica mais frágil e mais doce...
Há palavras que não precisam de ser ditas..
E mesmo a solidão....
não é uma solidão profunda....
Mesmo que só haja memórias para a percorrer...
Se continuo a existir em ti....
nunca morrerei.....
Mesmo que te abandone fisicamente....
E as horas sejam vagarosas.......

sexta-feira, outubro 15, 2010

TAL COMO É

Não me deixem tranquilo
não me guardem sossego
eu quero a ânsia da onda
o eterno rebentar da espuma

As horas são-me escassas:
dai-me o tempo
ainda que não o mereça
que eu quero
ter outra vez
idades que nunca tive
para ser sempre
eu e a vida
nesta dança desencontrada
como se de corpos
tivéssemos trocado
para morrer vivendo

de Mia Couto

O meu comentário???
Mas o que é viver e morrer??
Viver é seguir o ritmo da onda...
Sentir o ritmo, dançar ao ar livre...
Rir com as horas...
Nunca serão escassas...
Podem ser doridas e pesadas.
Podem ser um presente,
um bombom,
quando tranquilas...
Isso, sim,
é saber viver a beleza
do bater das ondas...
A vida
e aceitar o fim tal como ele é...



segunda-feira, outubro 11, 2010

FELIZ

dois amantes, o mundo
cada um no seu reino, beijam-se na praia
quando as ondas batem as areias

o mar é o meu navio,
hoje naufrago feliz

sabes quem sou, as dunas
que se levantam com o vento são
os sonhos do amor que dormita
em sossego nas praias

a terra és tu o mar sou eu

"Dois Amantes, o Mundo" de Jorge Reis-Sá
 in "A Palavra no Cimo das Águas"

O meu comentário???
Não durmo..
Só sonho e estou em paz...
Num sossego que nada perturba...
Nem o mar, nem o vento..
Sei quem tu és...
Escrevo tantas vezes o teu nome...
Vejo-o em qualquer lugar...
Mesmo nas dunas onde afundo os pés...
Brincando com a areia escaldante,
oferecendo-te os lábios para mais um beijo...
E, sim, estou feliz....





segunda-feira, setembro 20, 2010

ONDA DO TEMPO, ONDA DO MAR

De que céu caído,
oh insólito,
imóvel solitário na onda do tempo?
És a duração,
o tempo que amadurece
num instante diáfano;
flecha no ar,
branco embelezado
e espaço já sem memória de flecha.
Dia feito de tempo e de vazio:
desabitas-me, apagas
o meu nome e o que sou,
enchendo-me de ti: luz, nada.

E flutuo, já sem mim, pura existência

"Dia" de Octavio Paz in "Liberdade sob palavra"
Tradução de Luis Piganalli

O meu comentário???
A onda do tempo é como a onda do mar.
É única - por vezes, cruel...
Desconhece o que é a luz
ou finge que não a vê...
Porque só existe
e naquele momento, não há nada...
Passado, presente ou futuro...
Paisões, desejos, amor...
Nada...
Nem mesmo os meus gritos de revolta
 o impedem...
De arrasar as memórias
da verdadeira razão de existir...
O tempo é como o mar....
Talvez o mar não seja tão impiedoso
 como o tempo....
Perdoem-me
se disser que não sei....
Não sei mesmo....

quarta-feira, setembro 15, 2010

VERDADEIRA

Se é real a luz branca
desta lâmpada, real
a mão que escreve, são reais
os olhos que olham o escrito?

Uma palavra à outra
o que digo desvanece-se.
Sei que estou vivo
entre dois parênteses.

Certeza de Octavio Paz in "Dias Hábeis"
Tradução de Luis Pignatelli

O meu comentário???
Sem contar as horas,
ou os anos.
Ou entristecer
porque ninguém lê
o que escrevemos.
A chave para a realidade
é a luz.
Interpretar,
descrever a luz.
Essa luz segura,
tranquila.
Em que o medo não entra,
em que nada pode
desvanecer-se,
porque a luz é bem real.


segunda-feira, setembro 13, 2010

ALMA LIVRE

Quero dos deuses só que não me lembrem
Serei livre - sem dita nem desdita,
Como o vento que é a vida
Do ar que não é nada.
O ódio e o amor iguais nos buscam; ambos
Cada um com seu modo, nos oprimem.
A quem os deuses concedem,
Nada, tem liberdade

"Quero dos deuses só que não me lembrem"
de Ricardo Reis, in "Odes"

O meu comentário???
Não sei...
Porque não sei se os deuses,
 alguma vez,
me concederam
alguma coisa...
Estranho pensar nisso agora...
Quando o meu reflexo no espelho
 é finalmente claro...
Não que não tenha dúvidas,
porque as tenho...
Mas porque posso ver
como os meus olhos
estão brilhantes...
E isso significa que
a alma está livre....