sexta-feira, junho 03, 2011

NADA

A Sofreguidão de um Instante

Tudo renegarei menos o afecto,
e trago um ceptro e uma coroa,
o primeiro de ferro, a segunda de urze,
para ser o rei efémero
desse amor único e breve
que se dilui em partidas
e se fragmenta em perguntas
iguais às das amantes
que a claridade atordoa e converte.
Deixa-me reinar em ti
o tempo apenas de um relâmpago
a incendiar a erva seca dos cumes.
E se tiver que montar guarda,
que seja em redor do teu sono,
num êxtase de lábios sobre a relva,
num delírio de beijos sobre o ventre,
num assombro de dedos sob a roupa.
Eu estava morto e não sabia, sabes,
que há um tempo dentro deste tempo
para renascermos com os corais
e sermos eternos na sofreguidão de um instante.
José Jorge Letria, in "Variantes do Oiro"

O meu comentário???
Sei como é banal
afirmar-se isso...
Um instante,
uma eternidade....
Sei como o tempo
escorrega por entre os dedos...
E como há perguntas
que não devem ser feitas...
Para que não apaguem
depois memórias felizes...
Para que se possa,
efectivamente,
renascer
quando nos sentimos vazios...
De afectos,
de nós próprios...
Ou de nada....



quinta-feira, junho 02, 2011

ESCURIDÃO

O Amor Tudo Mata quando Morre

Eu morro dia a dia, sabendo-o, sentindo-o,
com a morte do amor em mim.
Esvaiu-se, ensandeceu, partiu,
espécie de sol sepultado por mãos ímpias,
numa cratera de lua, algures,
ou na tristeza de um retrato emudecido
pela ausência de vozes em redor.
Sem ele, a casa ficou deserta
de risos, acenos e afectos, de tudo,
as mãos ficaram ásperas, secas,
a pele do rosto gretada, fria,
e o sangue tornou-se lento e espesso,
incapaz de dar vida às pequenas folhas
orvalhadas da imaginação das noites.
A erva cresce em redor de mim,
os limões ficaram ressequidos sobre
a toalha bordada, num canto da mesa.
O amor tudo mata quando morre,
detendo no seu movimento elementar,
a máquina que ilumina o coração do dia.

José Jorge Letria, in "Quem com Ferro Ama"

O meu comentário???
Porque não te tenho...
Já não existo em ti...
As noites são apenas isso:
o acabar do dia...
O acabar de sonhos
e de afagos reais...
Desejos concretos
e beijos sem fim....
Fico sem vontade de falar,
ou mesmo de ouvir...
Perdi a vontade,
a certeza do que tinha....
Fiquei só, sem o calor do Sol....
Mesmo na escuridão da noite....

terça-feira, maio 31, 2011

DIGNIDADE

8ªSOMBRA

Quem és tu, quem és tu, vulto gracioso,
Que te elevas da noite na orvalhada?
Tens a face nas sombras mergulhada...
Sobre as névoas te libras vaporoso ...

Baixas do céu num vôo harmonioso!...
Quem és tu, bela e branca desposada?
Da laranjeira em flor a flor nevada
Cerca-te a fronte, ó ser misterioso! ...

Onde nos vimos nós? És doutra esfera ?
És o ser que eu busquei do sul ao norte. . .
Por quem meu peito em sonhos desespera?

Quem és tu? Quem és tu? - És minha sorte!
És talvez o ideal que est'alma espera!
És a glória talvez! Talvez a morte!

(Castro Alves - 1847 - 1871)

O meu comentário???
Ou simplesmente o amor....
O desejo ou a paixão....
O que sempre rejeitei....
Por medo???
Por egoísmo????
Tanta coisa pode ter sido....
Tanta coisa eu podia ter sido....
Talvez devesse ter olhado para o lado,
mais vezes....
Escutado quem precisava que o ouvisse....
O que devo fazer agora???
Se não é a sorte nem a glória....
Aceitar a morte com dignidade???